JAL 123

 

O pior acidente da história da aviação

 

envolvendo uma só aeronave

 

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ÍNDICE



 

O ACIDENTE

 

O tempo estava úmido, com uma leve nebulosidade, algo comum, quando o voo JAL 123 preparava-se para decolar do Aeroporto Haneda. Nos controles estava o capitão Masami Takahama, 49, que voava para a JAL desde 1966 e era considerado tão altamente qualificado, que havia sido transferido das rotas internacional para as rotas domésticas havia quatro anos, exclusivamente para que pudesse ajudar a treinar os pilotos mais novos. O restante da tripulação incluía o copiloto Yutaka Sasaki, o engenheiro de voo Hiroshi Fukuda e doze comissários de bordo.

 

A Tripulação do voo JAL 123 o Comandante Masami Takahama (esquerda),

o primeiro oficial Yutaka Sasaki (centro) e o engenheiro de voo Hiroshi Fukuda (direita)

 

Havia 509 passageiros a bordo do Boeing 747SR, uma versão “short-range” do Jumbo, fabricado para operar curtas distâncias com maior capacidade de passageiros. A JAL e a All Nippon Airways eram as únicas linhas aéreas que utilizavam esse modelo de Boeing, que é reforçado estruturalmente para absorver as sacudidas das decolagens e das aterrissagens frequentes exigidas em rotas mais curtas. Como parte de sua frota de 49 B747s, o maior do mundo na época, a JAL operou dez modelos “short-range”.

 

As passagens para o voo a Osaka, cidade com 2.625.000 habitantes, localizada a 250 milhas (cerca de 400 km) a sudoeste do Tóquio, foram quase totalmente vendidas. De seus 528 assentos disponíveis, 509 seriam ocupados, sendo que 12 deles, por crianças.

O voo JAL 123 decolou da pista C-15-L com um atraso de doze minutos em relação a sua programação inicial. Eram 18h12 (hora local de Tóquio), quando o Boeing prefixo JA 8119 decolou de Haneda para um voo de aproximadamente uma hora, com o comandante Takahama sentado à direita e o copiloto em instrução ocupando o assento da esquerda.

O plano de voo do JAL 123 previa uma subida direta para o nível 240 (24.000 pés) e o sobrevoo de Mihara, Hakone, pela lateral do Monte Fuji, entrando na aerovia W27 para Kushimoto, aerovia V55 para Shinota e finalmente, Osaka. O tempo previsto de voo era de 54 minutos.

Às 18h17, a tripulação do JAL 123 solicitou ao Controle de Tóquio uma rota mais direta, sendo atendida após alguns segundos. O controlador observava o progresso do Boeing, que já cruzava a 24.000 pés, passando perto da pequena ilha de Oshima, ao sul de Haneda, quando, às 18h25, a 20 milhas a oeste e se aproximando da Península de Izu, surgiram os primeiros problemas. O controlador mal teve tempo de perceber a mudança na rota quando recebeu a primeira mensagem do 747, em inglês, a língua da aviação internacional.

JAL 123: Tóquio, JAL 123. Imediato. Problemas. Solicito imediato retorno a Haneda e descer para nível 220.

Controle de Tóquio: Roger. Aprovado como solicitado. Desça e mantenha o nível 220 [22.000 pés].

Dois minutos mais tarde, um membro da tripulação acionou o código de emergência 7700

Controle de Tóquio: Confirme a emergência declarada. É isso mesmo?

JAL 123: Sim. Afirmativo.

Sentada na fileira 56, a apenas quatro fileiras da extremidade da cabine, Yumi Ochiai, 26, comissária de bordo do voo JAL 123, percebeu que havia problemas. “Ouvi um ‘bang’ repentino [uma expressão que emula um ruído alto]”, recordou-se mais tarde. “Era na parte traseira do avião. Meus ouvidos doeram. Imediatamente, o interior da cabine ficou branco."

A cabine havia perdido a pressão: a névoa branca era causada pela precipitação do ar frio exterior que entrava na área dos passageiros.

“Nenhum som de explosão foi ouvido,” relatou Ochiai. “O teto, acima dos lavabos traseiros, caíram. As máscaras de oxigênio automaticamente desceram ao mesmo tempo em que o aviso para usá-las começou a soar.”

O controlador aéreo do Tóquio indicou para a tripulação girar para o leste em busca de um retorno a Haneda. Nesse momento, o radar mostrou que o Jumbo estava a 24.500 pés, voando a 471 mph (cerca de 750 km/h).

Às 18h28, o radar indicava que o JAL 123 estava se dirigindo para o noroeste ao invés do leste.

JAL 123: Solicita um vetor direto para Oshima.

Controle de Tóquio: Voe na proa 090, direto Oshima.

A resposta foi sinistra:

JAL 123: Ok, mas sem controle agora. Sem controle!

Foi então que o controlador percebeu que havia algo de muito errado com o JAL 123. Ao invés da curva de 177º, o Boeing descreveu uma curva de apenas 50º para a direita.

Dentro do Boeing, a tripulação do Comandante Takahama lutava contra o 747, que voava totalmente descontrolado. Minutos antes, mais precisamente as 18h24, o Jumbo simplesmente perdera todo o seu estabilizador vertical.

Em 1978, o JA 8119 havia feito um pouso duro e batido com a parte inferior da fuselagem traseira na pista do aeroporto de Osaka, para onde o voo 123 destinava-se agora. O Boeing foi então retirado de serviço e, durante alguns meses, foi reparado por um time de técnicos da JAL, supervisionado por engenheiros da própria Boeing. Dado como seguro para voltar a voar, o 747 entrou novamente em operação e, assim, voou pelos sete anos seguintes, até aquela fatídica tarde.

O que ninguém sabia, entretanto, é que a despeito de todos os cuidados tomados, o reparo havia sido mal feito. Quis o destino que naquela tarde quente e abafada, o reparo chegasse ao seu limite. Deu-se por fim a fadiga do metal usado para unir as placas substituídas. Como uma costura que se rasga, o metal cedeu, provocando uma súbita e violenta ruptura na fuselagem, que por sua vez atingiu o cone de pressurização da cabine. Como uma bomba, a estrutura rompeu-se sob o efeito da diferença de pressão entre o interior da cabine e o ar externo, rarefeito. A sequência de explosões rompeu a fixação do reparo feito no Boeing 747. Como um trágico jogo de dominó, o próximo efeito foi que a base de fixação da cauda desprendeu-se, despedaçando e deixando a aeronave sem a cauda, virtualmente sem a mais remota chance de controle.

Na cabine de comando, Takahama assumiu o controle do jato, ou melhor, o que restava dele. Sem a cauda, o 747 balançava de um lado para outro, sem controle no eixo vertical, horizontal ou lateral. Como um paralelepípedo, o jato somente se mantinha em voo pela velocidade que seus quatro motores forneciam. E foi com eles que Takahama tentou o impossível: trazer o Jumbo de volta a Tóquio.

Na cabine de passageiros, Ochiai sentiu o avião entrar no que chamou de “hira-hira”, uma expressão japonesa que descreve a queda de uma folha, se contorcendo suavemente.

Até aquele momento, pouco se sabia dentro da cabine de comando sobre as razões da falha, o que poderia ter causado a perda súbita de toda pressão hidráulica e sobre as dificuldades de manejo: em segundos, os três sistemas hidráulicos redundantes do 747 havia perdido toda a pressão, tornando inoperantes os controles de voo básicos: o 747 não contava mais com os ailerons, leme e profundores.

Segundos após a explosão, um comissário interfonou para a cabine de comando e informou que uma forte explosão havia sacudido a parte de trás da cabine de passageiros e que havia despressurização. Takahama escutou quando seu engenheiro de voo foi informado do que havia acontecido. Sem outra opção, o Comandante começou então a variar a potência dos motores, tentando fazer que o 747 ganhasse ou perdesse altura, e, variando a potência entre os motores de cada uma das asas, fizesse curvas. Missão impossível.

O movimento do 747 entrou numa oscilação continua, chamada em física de oscilação fugóide. Como um gigantesco pêndulo, o 747 subia e descia 1.500 metros a cada 90 segundos, fazendo com que o nariz da aeronave variasse entre 15º para cima e 5º para baixo, bem como a velocidade, que oscilava de 200 a 300 nós. As asas moviam-se 50º para cima ou para baixo em ciclos de apenas 12 segundos. O 747 voava como uma folha seca ao vento.

Dentro da cabine de passageiros, a atmosfera era de absoluto terror. Quando situações de pânico extremo acontecem, ao contrário do que mostram os filmes, a maioria das pessoas entram num estado conhecido como "pânico negativo": ficam imóveis, caladas, olhos fechados ou vidrados, incapazes de se mover ou emitir sons. O cérebro entra em curto-circuito e se recusa a processar a dura realidade, a confrontar a real iminência da morte.

Era o caso. Choros abafados, alguns soluços e nada mais. Nenhuma histeria, apenas o mais profundo e incapacitante terror. Mover-se pela cabine era impossível, pois o próprio movimento oscilatório da aeronave prendia os passageiros aos seus assentos. Além disso, com a entrada de ar frio externo, a atmosfera dentro da cabine ficou turva como num denso nevoeiro. Se os passageiros mal podiam manter-se de pé, ao menos alguns deles podiam escrever. Muitos o fizeram: mais de 30 cartas de despedida foram escritas durante os 32 longos minutos que o JAL 123 lutou contra seu destino.

"A meus três filhos: tomem conta de sua mãe. O avião está caindo e vem uma fumaça branca da parte de trás. Podemos ter apenas mais cinco minutos. Nunca mais quero entrar em um avião", escreveu Hiroshi Kawagushi, 52, chefe do escritório da empresa de navegação Mitsui Osk Lines em Kobe, perto de Osaka. Dirigindo-se ao seu filho mais velho, ele escreveu: "Não há esperança. Foi uma vida feliz para mim. Tsuyoshi, tome conta de todos. Deus nos ajude. Adeus". A mensagem ocupava sete páginas de sua agenda. O químico e chefe de escoteiros Massakatsu Tanigushi, 40, escreveu apenas um pequeno recado para sua mulher, escrito às pressas em um saco de papel higiênico: "Machiko tome conta dos garotos". O bilhete foi encontrado dentro de sua carteira de motorista, em meio aos destroços do avião.

De volta à cabine, o Comandante Takahama chamou o Controle de Tóquio.

18h33 - JAL 123: Solicito retorno imediato para Haneda.

Controle de Tóquio: Você está a 72 milhas de Nagoya. Pode pousar em Nagoya?

18h33 - JAL 123: Solicito retorno para Haneda.

Uma cidade litorânea, Nagoya está a 160 milhas a sudoeste do Tóquio. Mas a tripulação insistia em voltar a Haneda.

Nesse instante, o avião estava voando novamente a 24.500 pés. A única sugestão de uma causa potencial do problema por parte da tripulação veio também às 18h33, mas não era correta. “R5 quebrada,” um membro de equipe relatou pelo rádio. A referência era à porta traseira direita do avião, através da qual a comida e os outros suprimentos são colocados na cabine. Mas essa porta não havia sido aberta em Haneda antes da decolagem.

Às 18h35, a comissária de bordo Ochiai percebeu que o oxigênio havia parado de sair da máscara, mas ela não teve nenhuma dificuldade em continuar respirando. Só nesse momento, outro comissário de bordo avisou aos passageiros que havia uma emergência. Ochiai passou a ajudar os outros tripulantes a instruir os passageiros a como prender seus cintos e a se posicionar para um possível impacto durante uma aterrissagem forçada.

Às 18h40, Ochiai foi surpreendida ao ver o Monte Fuji numa janela à esquerda. “Eu pensei que o avião estava se dirigindo de volta a Haneda,” disse. Realmente, os operadores de radar viram o avião fazer neste momento um círculo largo, perto da montanha sagrada do Japão.

Takahama lutava desesperadamente pela sobrevivência. A velocidade do 747 era um problema, pois ele começava a querer descer. Sem flaps, Takahama ordenou que os trens fossem soltos pela própria gravidade, pois o acionamento pelo sistema hidráulico, ele já não podia usar. Os trens baixaram com um estrondo e reduziram a velocidade do Jumbo, bem como diminuíram a intensidade das oscilações fugóides. O controlador em Tóquio observava na tela do radar a trajetória e altitude do JAL 123.

18h47 - Controle de Tóquio: JAL 123, você já consegue controlar a aeronave?

JAL 123: Negativo. Incontrolável.

Mal terminou de dizer isso, a tripulação do 747 deparou-se com montanhas. Alarmado, Takahama ordenou:

Cmte. Takahama: Uma montanha! Curva à direita! Vamos bater na montanha! Acelere!

Copiloto: Oh, não!

O 747 estolou, descontrolado. Sua velocidade caiu para 108 nós. A aeronave entrou num mergulho, mas, por milagre, acabou saindo sozinha.

Cmte. Takahama: Potência máxima!

Engenheiro de voo: Estamos ganhando velocidade!

Cmte. Takahama: Continue tentando!

Os esforços deram certo. O 747 acelerou para 220 nós, e então Takahama comandou a atuação elétrica de emergência dos flaps, que desceram para a posição de 5º. Esse processo levou quase 4 minutos, período durante o qual o 747 subiu para 11.000 pés. Takahama então foi chamado pelo Controle de Tóquio:

18h51 - Controle de Tóquio: JAL 123, sua posição é de 45 milhas a noroeste de Haneda.

Cmte. Takahama: Noroeste de Haneda? Ok, ok. Quantas milhas?

Controle de Tóquio: Er... 55 milhas de Haneda, 25 de Kumagaya. Estamos prontos para seu retorno a qualquer momento. A Base Aérea de Yokota também está pronta para recebê-los!

O Cmte Takahama não respondeu. Na cabine de comando do 747, a situação fugia rapidamente de controle. Com as montanhas perigosamente por perto, o 747 descia a uma razão de 1.350 pés por minuto. Takahama aproximava-se de sua batalha final.

18h55:04 - Cmte. Takahama: Flap set?

Copiloto: Sim, flap 10.

18h55:10 - Cmte. Takahama (agitado): Nariz em cima! Nariz em cima! Nariz em cima!

Copiloto: Nariz em cima!

18h55:42 - Cmte. Takahama: Ei! Segure o flap! Não dê tanto flap! Flap Up! Flap Up! Flap Up!

A gravação do CVR, Cockpit Voice Recorder, começa a registrar o som das turbinas do 747 refletido nas montanhas que o 747 sobrevoava a poucos metros dos cumes. Ouve-se claramente a aceleração dos motores, mas o nariz do 747 continua teimosamente para baixo, a despeito de todos os esforços dos tripulantes. O ensurdecedor ruído de vários alarmes soando pela cabine de comando, somado ao ruído dos motores em potência máxima cria uma cacofonia angustiante. O desespero dos tripulantes fica gravado para sempre na caixa preta. Eles agora apenas gritam entre si.

Em terra, Keiichi Yamazaki, um morador local, ouviu o som incomum de um avião de passageiros acima de sua casa em Nippara, uma remota aldeia na montanha.

“Subitamente, um grande avião apareceu do nada entre as montanhas.” recordou. “Quatro vezes inclinou-se à esquerda, e a cada vez, tentou recuperar seu equilíbrio à direita. Estava voando como um bêbado descontrolado.”

Na aeronave a luta pela sobrevivência continuava:

18h55:55 - Cmte. Takahama: Power! Power! Flap!

Copiloto: Flap em cima!

O JAL 123 e seus 528 ocupantes já não tinha mais salvação. O Boeing 747 entrou no seu derradeiro mergulho, girando 200º em seu eixo e entrando numa descendente abrupta, nariz firmemente apontado para baixo.

Começam a soar pela cabine os alarmes gravados no sistema GPWS: Sink rate! Sink rate! Pull Up! Pull Up!

18h56:06 - Cmte. Takahama: Power!

Na cabine de passageiros, Ochiai havia se prendido em seu acento com seu cinto. “O avião começou a cair em um ângulo forte, quase verticalmente,” ela recordou.

Os controladores, horrorizados, viam no radar o Jumbo abaixo de 10.000 pés, caindo, e então, às 18h57, desaparecendo definitivamente da tela dos radares.

O 747 ainda prosseguiu mergulhado em forte inclinação em direção ao Monte Osutaka, um pico coberto de granito.

No Cockpit Voice Recorder, ouve-se então nitidamente o som do primeiro impacto da asa esquerda contra a copa de árvores.

Mais dois segundos e chega ao fim a gravação: o 747 explode contra o monte Osutaka, com seus 5.400 pés de altura.

O impacto deu-se a aproximadamente 200m abaixo do pico e a uma velocidade de 140 nós. Os tanques de combustível do 747 romperam-se imediatamente e um gigantesco incêndio tomou conta da área. Pesando mais de 350 toneladas, a aeronave enterrou boa parte de sua fuselagem na montanha.

“Logo houve dois ou três impactos muito fortes, e os assentos e tudo mais caiu sobre mim. Eu fiquei presa com os assentos sobre mim, e não podia me mover. Eu sofri uma dor perfurante em meu estômago”, relatou a comissária Ochiai.

Já estava escuro na hora do acidente e as equipes de socorro só chegariam ao remoto local da tragédia no alvorecer do dia seguinte. Para incredulidade total dos socorristas, quatro passageiras (duas delas crianças de 12 e 8 anos) foram retiradas com vida e sobreviveram. Estavam todas elas sentadas nas últimas fileiras do avião.

 

Por Jorge Tadeu da Silva (com Wikipédia / JetSite / Revista Times)


A FOTO DA AERONAVE AVARIADA AINDA EM VOO

 

Há uma dúvida se a foto acima é realmente do Boeing 747 da JAL que se acidentou

 

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Na foto acima, a cauda da aeronave totalmente ausente

 

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A imagem é a forma como o avião aparece avariado - ainda em voo - nos livros japoneses e no Relatório Oficial sobre o acidente. Olhe para a cauda do avião. Um especialista estaria certo de que cerca de 50% dela está faltando.

 

Já na imagem publicada pela "Flight Safety", nenhum pedaço da cauda está aparente. Essas duas imagens geraram - sem sucesso - diversos pedidos de abertura de um novo processo investigativo sobre o acidente.

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Veja a simulação do acidente clicando AQUI.

Nos mapas rota percorrida pelo JAL 123 até sua queda - Imagens: Wikipédia / AirDisaster.Com.

 


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